O árbitro de emergência: uma interessante alternativa

No final de julho, o Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (CAM-CCBC) publicou a Resolução Administrativa nº 32/2018, a qual regulamenta o procedimento para utilização do árbitro de emergência caso haja a necessidade de se obter medidas de urgência antes de constituído o Tribunal Arbitral.
Apesar de a previsão de um árbitro de emergência não ser uma novidade no exterior (o Regulamento da CCI – Câmara de Comércio Internacional, por exemplo, já previa em 2012 a utilização dos árbitros de emergência em seu artigo 29: “A parte que necessitar de uma medida urgente cautelar ou provisória que não possa aguardar a constituição de um tribunal arbitral (“Medidas Urgentes”) poderá requerer tais medidas nos termos das Regras sobre o Árbitro de Emergência dispostas no Apêndice V” – 2012 ICC Rules), esta inovação do mais importante centro de arbitragem do país vem despertando o interesse dos profissionais que atuam em procedimentos arbitrais para a figura do árbitro de emergência, que ainda possui grande espaço de crescimento no Brasil.
Atualmente, não há mais grandes controvérsias a respeito da apreciação das tutelas de urgência em litígios que devam ser submetidos à arbitragem. Se a urgência surge quando o procedimento arbitral já se encontra em curso, o Tribunal Arbitral possuirá jurisdição para apreciar o pedido da parte.
A questão mais sensível ocorre quando a tutela de urgência se faz necessária antes de instaurado o Tribunal Arbitral. Tendo em vista o lapso temporal natural entre o pedido de instauração da arbitragem e a formação do corpo de árbitros, a jurisprudência se consolidou permitindo que a parte busque, perante o Judiciário, as providências urgentes que entender necessárias.
Esta orientação foi positivada na última reforma da Lei de Arbitragem, que, em seus artigos 22-A e 22-B, dispõe ser possível, antes da instalação do Tribunal Arbitral, que a parte recorra ao Judiciário para concessão de medida de urgência, bem como caber aos árbitros, após a sua instituição, manter ou alterar a medida concedida no âmbito judicial.
São muitas as razões que levam determinados contratantes a submeter seu litígio à arbitragem. Dentre elas, destacam-se a especialidade dos árbitros sobre o assunto, a velocidade do julgamento e a confidencialidade do procedimento. Naturalmente, as partes desejam ter estas mesmas características em eventual julgamento de pleitos urgentes, ainda que estes surjam antes de instaurado o procedimento arbitral.
Para evitar submeter o litígio ao Judiciário quando há medidas de urgência a serem tomadas, a solução se dá com a adoção da figura do árbitro de emergência, já prevista em alguns regulamentos das Câmaras de Arbitragem mais conhecidas no Brasil, como recentemente previu o CAM-CCBC.
Este instituto, criado para aperfeiçoar a prestação jurisdicional arbitral, tem como finalidade atender às necessidades de providências urgentes que não podem aguardar sequer a instauração do procedimento arbitral. Com isso, o árbitro de emergência acaba por resolver uma relevante omissão da tutela arbitral, qual seja, a apreciação de pleitos urgentes antes da formação do Tribunal Arbitral.
Na prática, o chamado árbitro de emergência é um procedimento prévio ao início da arbitragem, em que uma das partes solicita uma decisão de caráter urgente e, apenas para a apreciação específica deste pleito, o Centro de Arbitragem eleito na cláusula compromissória elege um árbitro, que não poderá ser apontado para compor o Tribunal Arbitral posteriormente.
Em regra, o início da jurisdição do Tribunal Arbitral retira a jurisdição do árbitro de emergência e, como consequência, o Tribunal tem a prerrogativa de decidir se mantém, revoga ou altera a decisão anteriormente adotada.
A primeira remissão ao árbitro de emergência foi inserida em 2006, no regulamento ICDR – International Center for Dispute Resolution, da AAA – American Association Arbitration. A partir de então, outras Cortes Internacionais de arbitragem passaram a prever regras semelhantes, destacando-se, como mencionado acima, a CCI (em Português) ou ICC – International Chamber of Commerce. A LCIA – London Court of International Arbitration, por seu turno, optou por algo semelhante ao árbitro de emergência, denominado “expedited formation”, no qual disponibiliza a possibilidade de instituição de um Tribunal Arbitral excepcionalmente célere para decidir questões urgentes. No Brasil, além do CAM-CCBC, a Câmara de Arbitragem e Mediação da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (CAM-FIEP) e a Câmara de Arbitragem do Mercado possuem regramento parecido para o árbitro de emergência.
Analisando os regulamentos destas Cortes Arbitrais, nota-se que há duas formas de previsão do árbitro de emergência. Em algumas delas há o denominado opt in, isto é, as partes devem estipular expressamente que desejam se submeter ao instituto e aos procedimentos inerentes ao árbitro de emergência. Em outras, há a chamada cláusula opt out, por meio da qual se exige a previsão inequívoca das partes afastando o árbitro de emergência, sob pena de o mesmo produzir efeitos normalmente. A Câmara do Mercado e o CAM-CCBC são exemplos do opt in e a CAM-FIEP do opt out.
Verifica-se, ademais, que na maioria dos regulamentos dos centros arbitrais acima mencionados, inclusive os internacionais, há previsão de oitiva da parte contrária previamente à decisão do árbitro de emergência, ainda que muito breve. Isso, se por um lado, em determinadas situações acaba deixando o procedimento arbitral mais lento que a decisão perante o Judiciário, por outro, confere maior respeito ao contraditório, um dos pilares da arbitragem.
Há alguns meses houve um caso de rumor envolvendo a decisão de árbitro de emergência. Durante a recuperação judicial da Oi, uma das suas acionistas acionou o procedimento do árbitro de emergência da Câmara do Mercado para apreciar um pedido urgente em um litígio de cunho societário. Após o contraditório, o árbitro de emergência apontado pela Câmara proferiu a decisão. Em que pese a mesma ter sido suspensa posteriormente pelo STJ, que entendeu ser esta matéria de competência do juízo da recuperação judicial, o fato é que o instituto do árbitro de emergência mostrou que pode ser uma opção eficaz, célere e de grande utilidade às partes.
Não há notícia da utilização do árbitro de emergência com frequência no Brasil. No entanto, o instituto nos parece uma interessante alternativa à disposição das partes que preferem submeter seu litígio à arbitragem, resolvendo o problema das questões de urgência que poderiam surgir antes da constituição do Tribunal Arbitral. Com isso, esperamos que as câmaras arbitrais que ainda não incorporaram o instituto aos seus regulamentos o façam o quanto antes, privilegiando a tutela arbitral em todas as questões a serem resolvidas, inclusive nas de urgência.
Por Felipe Hermanny, sócio da área de Contencioso e Arbitragem do Campos Mello Advogados. E Vinicius Pereira, associado sênior da área de Contencioso e Arbitragem do Campos Mello Advogados.
Fonte: Jota – 22/09/2018
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